Lei da Reforma Trabalhista

A Lei 13.467/2017, conhecida como Lei da Reforma Trabalhista, trouxe inúmeras novidades na legislação. No entanto, como já era esperado, essas novas possibilidades iriam precisar de um tempo de maturação, pois, como é de conhecimento geral, a Justiça do Trabalho possui uma natureza voltada para a tutela do trabalhador e a grande maioria das novidades legislativas flexibilizou essas regras sob o pretexto de “destravar a economia”.

E o tempo passou.

A aplicação da reforma trabalhista em todas as suas nuances já é uma realidade. Seja dos requisitos da petição inicial ao incidente de desconsideração da personalidade jurídica, do “teto” de remuneração para concessão da justiça gratuita ao impulso oficial na execução, enfim, já é possível experimentar todas as novidades da Lei 13.467/17.

Novidades da Reforma Trabalhista

Uma das novidades da Reforma Trabalhista foi a possibilidade da utilização do chamado seguro garantia judicial. A inovação foi bastante festejada inicialmente, pois reduz o custo recursal ou permite a garantia da execução a custos mais baixos para o empresário.

No entanto, com a resistência da jurisprudência em aceitar “qualquer” seguro garantia, o que antes era festejado passou a representar uma verdadeira insegurança jurídica. Isso porque, sem regulamentação precisa, o mercado de seguro judicial sofreu um natural aquecimento, mas essa agitação do mercado veio de forma desenfreada e foram colocados no mercado diversos seguros que, segundo o entendimento dos Tribunais, não representava uma efetiva garantia da execução.

O seguro garantia judicial serve, em suma, para a garantia da execução e também como pressuposto de admissibilidade recursal. 

Para dirimir tal insegurança jurídica, o Tribunal Superior do Trabalho, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho e a Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho editaram, em 16 de outubro de 2019, o Ato Conjunto TST.CSJT.CGJT 1/2019 que “Dispõe sobre o uso do seguro garantia judicial e fiança bancária em substituição a depósito recursal e para garantia da execução trabalhista.” e está disponível para consulta em https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/163824/2019_atc0001_tst_csjt_cgjt.pdf?sequence=1&isAllowed=y.

O art. 3º, do referido Ato Conjunto estabelece uma série de requisitos para a aceitação do seguro garantia judicial.

Logo no inciso I, o Ato Conjunto dispõe que o valor segurado deverá ser igual ao montante original do débito executado com os encargos e os acréscimos legais, inclusive honorários advocatícios, assistenciais e periciais, devidamente atualizado pelos índices legais aplicáveis aos débitos trabalhistas na data da realização do depósito, acrescido de, no mínimo, 30%. 

Conforme prevê o inciso I, esse acréscimo de 30% somente será devido em caso de execução, lembrando que o seguro garantia pode ser utilizado tanto para execução, quanto para depósito recursal.

No entanto, mesmo para os casos de utilização de seguro garantia para substituição ao depósito recursal, o valor segurado inicial deve ser igual ao montante da condenação, acrescido de, no mínimo 30%, observados os limites estabelecidos pela Lei 8.177/91 e pela Instrução Normativa 3 do TST, como prevê o inciso II, do referido Ato Conjunto.

Outra previsão do Ato Conjunto é a necessidade de previsão na apólice de que a indenização será atualizada pelos índice legais aplicáveis aos débitos.

Aqui vale o questionamento: se a CLT prevê a utilização da Taxa Referencial e a jurisprudência aplica o IPCA, qual deverá ser atualização da apólice? Essa é uma questão que não foi respondida pelo Ato Conjunto, mas que seria de bom tom ter sido desde logo esclarecida.

Seguro Garantia Judicial

Agora, a mais polêmica das questões envolvendo o seguro garantia judicial fica por conta do prazo de vigência da apólice.

Muito tem se falado atualmente sobre o prazo de vigência da apólice de seguro.

Inclusive, a maioria dos Tribunais Regionais do Trabalho já sedimentaram o entendimento quanto à necessidade de a vigência ser ilimitada para atender ao art. 899, § 11, da CLT. Para exemplificar, destacamos algumas ementas de Tribunais distintos:

“DEPÓSITO RECURSAL – SUBSTITUIÇÃO POR SEGURO GARANTIA JUDICIAL – PRAZO DE VALIDADE LIMITADO – DESERÇÃO. Em face da permissão concedida pelo § 11 do artigo 899 da CLT, incluído pela Lei 13.467/2017, e observado o artigo 20 da Instrução Normativa nº 41 do C. TST, a reclamada pode apresentar seguro garantia como depósito recursal. Todavia, ainda que a apólice possua valor nominal superior ao teto previsto para a interposição de recurso ordinário, a indicação de prazo de vigência limita a sua liquidez e, portanto, não atende à finalidade do depósito recursal, que é a de garantia do juízo, ensejando o não conhecimento do apelo por deserção.” (TRT-15 – RO: 00106978120175150086 0010697-81.2017.5.15.0086, Relator: THELMA HELENA MONTEIRO DE TOLEDO VIEIRA, 9ª Câmara, Data de Publicação: 15/10/2018) 

“DEPÓSITO JUDICIAL. SEGURO-GARANTIA. DESERÇÃO. Não se presta a apólice de seguro-garantia judicial juntada aos autos à garantia do Juízo, não obstante o disposto no artigo 899, § 11, da CLT, pois não verificada a salvaguarda da finalidade do depósito recursal, qual seja, a efetiva proteção do crédito do trabalhador, importando em deserção do Apelo. Para a efetiva garantia, necessário, dentre outros requisitos, que o seguro seja contratado por prazo indeterminado, o que não se verifica no presente caso.” (TRT-3 – RO: 02085201313603005 0002085-76.2013.5.03.0136, Relator: Fernando Antonio Viegas Peixoto, Sétima Turma, Data de Publicação: 13/07/2018)

“DEPÓSITO RECURSAL. SUBSTITUIÇÃO POR SEGURO GARANTIA JUDICIAL. PRAZO DE VALIDADE LIMITADO. DESERÇÃO. Embora a substituição do depósito recursal por seguro garantia judicial tenha sido recepcionada pela alteração legislativa promovida pela Lei n. 13.467/17, a sua utilização deve ser feita segundo os preceitos que norteiam a existência do depósito recursal, como garantia do juízo, não se podendo admitir qualquer tipo de restrição que venha a dificultar o implemento de tal garantia. E, no caso dos autos, o seguro garantia tem validade de apenas três anos, o que se mostra incompatível com a natureza da garantia ofertada, que não pode ser precária, com risco acentuado de perda da garantia no decorrer da execução que eventualmente venha a ser instaurada. Recurso da reclamada não conhecido, por deserto.” (TRT 3ª Reg., 1ª T., RO 0011005-47.2016.5.03.0067, Rel. Des. Jose Eduardo Resende Chaves Jr., DEJT 13.07.2018) “Seguro Garantia. Depósito Recursal. Deserção. Não se presta para garantir a execução seguro judicial que tem prazo determinado, pois, diante da natureza de garantia do juízo, não se admite qualquer restrição que venha dificultar ou impedir a utilização dessa garantia.” (TRT 11 – Processo Nº RO-0001290-60.2016.5.21.0008 – Relator JOSEANE DANTAS DOS SANTOS – 18/09/2018)

“SEGURO GARANTIA JUDICIAL. PRAZO DETERMINADO. DESERÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. Considerando a possibilidade de não se ver atingida a sua finalidade, é indispensável que a apólice de seguro garantia, para que possa substituir o depósito recursal (nos termos do art. 899, § 11, da CLT), seja expedida com prazo de validade indeterminado ou, ainda, que nela conste a ressalva de que a sua vigência está atrelada à solução final do processo judicial. Em ela sendo expedida com prazo determinado, configura-se insubsistente o preparo, sendo impositivo o não conhecimento do recurso ordinário interposto. Apelo não conhecido.” (TRT 4 – Processo Nº RO-0020879-64.2016.5.04.0411- Relator ALEXANDRE CORREA DA CRUZ – 18/03/02019)

Mas não é só. 

Além dos Tribunais entenderem que o seguro garantia com prazo de vigência limitado seria insuficiente à garantia da execução, os Tribunais vêm aplicando o entendimento da Orientação Jurisprudencial nº 140 da SDI-1 do C. TST para fins de processamento dos recursos. 

Isto significa dizer que, por entenderem que não se trata de mera insuficiência de recolhimento, o recurso está será considerado deserto de forma automática. 

Com relação a esse ponto, o Ato Conjunto estabelece um prazo mínimo de vigência de 3 (três) anos no inciso VII, do art. 3º. Desta forma, agora com a vigência do Ato Normativo a tendência é que não exista mais a insegurança jurídica que repousava sobre a vigência da apólice do seguro garantia.

Além disso, conforme inciso IV, do art. 3º, do referido Ato, a apólice deverá prever expressamente que a seguradora manterá a vigência do seguro, mesmo quando o tomador não adimplir com o prêmio nas datas convencionadas. 

Com isso, a relação comercial entre a seguradora e a parte recorrente não afetará a garantia da execução. Sendo assim, o Ato Conjunto veio em boa hora para regulamentar a aplicação do seguro garantia judicial trabalhista, pois, principalmente quanto à vigência da garantia, havia o que muitos chamam de jurisprudência defensiva e, agora isso parece estar resolvido, pois existem parâmetros concretos para a aplicação da inovação trazida pela Lei 13.467/17.

Outro ponto importante é que o art. 5º, §2º, do Ato Conjunto estabelce que cabe ao juízo analisar a validade da apólice  mediante cotejo com o registro constante do sítio eletrônico da SUSEP no endereço https://www2.susep.gov.br/safe/menumercado/regapolices/pesquisa.asp.

Agora, com a publicação do Ato, aqueles que optam pela utilização do seguro garantia devem efetivamente observar os requisitos previstos no Ato Conjunto. Caso contrário estarão sujeitos à deserção de seus recursos ou não conhecimento dos embargos à execução, por exemplo.

Isso porque, o art. 6º, incisos I e II, do Ato Conjunto, estabelecem que, para o caso de seguro garantia judicial para garantir execução trabalhista, o desatendimento das regras previstas nos arts. 3º, 4º e 5º implicará o não conhecimento de eventuais embargos à execução e a determinação de penhora de bens e, no caso de seguro garantia judicial para substituição ao depósito recursal, a consequência será o não processamento ou não conhecimento do recurso, por deserção.

Ainda, conforme o parágrafo único, do art. 6º, do Ato Conjunto, fica vedada a utilização da mesma apólice para garantia de mais de um processo, o que resultará, assim como no uso de apólices falsas ou adulteradas, as mesmas consequências citadas no parágrafo anterior, acrescidas da imposição de multa por litigância de má-fé e representação criminal para apuração da possível prática de delito;

Com todas essas previsões sobre a utilização do seguro garantia judicial, sem dúvidas, haverá mais segurança jurídica não apenas para o recorrente ou executado, mas também para o credor/recorrido que terá a garantia de manutenção da vigência da apólice ainda que o tomador não cumpra com o pagamento nas datas avençadas com a seguradora, bem como regras para a utilização de tal modalidade de garantia sem prejuízo de seu crédito.

 

LUCAS GRISOLIA FRATARI

Sócio de Consani e Fratari Advogados. Especialista em Direito e Processo do Trabalho e Processo Civil pela PUC-Campinas e Direito Empresarial pelo INSPER.

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